segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Lei n° 11.10 de 9 de fevereiro de 2005

A Lei n° 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, introduziu no país o importante instituto da recuperação judicial, extinguindo do ordenamento jurídico nacional as antigas concordatas.

1. Obstáculos que dificultam o pleno êxito do processo recuperatório

A Lei n° 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, introduziu no país o importante instituto da recuperação judicial, extinguindo do ordenamento jurídico nacional as antigas concordatas. O novo instituto, destinado à superação da crise empresarial e respectiva preservação da empresa, despertou o entusiasmo de muitos até certa fase da tramitação do projeto de lei no Congresso Nacional, correspondendo a uma importante inovação oferecida aos empresários que atuam no Brasil, a exemplo do que se verifica em outros países.
O aludido entusiasmo foi arrefecido pela contundente e notória interferência do setor financeiro na elaboração da lei, que se mostrou determinante para uma mudança de rumo destinada a preservar os créditos de origem financeira dos efeitos da recuperação judicial, conforme se verifica no artigo 49, §§ 3° e 4° da lei de regência. Referido favorecimento, justificado para permitir a redução do custo do crédito no país, mostrou-se inócuo para a finalidade prevista, correspondendo a um dos maiores obstáculos para o êxito de muitos processos de recuperação judicial, o que gerou a realização de alguns ajustes nos casos concretos, conforme se verifica nas decisões judiciais que ampliam o improrrogável prazo de suspensão de 180 dias previsto nos arts. 6°, §4° e 49, §3°, objetivando a manutenção de bens essenciais no estabelecimento da recuperanda.
A recuperação judicial tem por finalidade principal a reestruturação da empresa para permitir a superação da crise econômica, financeira e/ou patrimonial. A reestruturação exige medidas destinadas a permitir a viabilidade econômica e financeira do empreendimento, capacitação técnica e gerencial da administração, credibilidade e transparência interna e externa da administração, estrutura de capital e organização patrimonial, bem como a capacidade de acesso a capitais e créditos. Entretanto, em grande parte dos processos de recuperação judicial os planos resumem-se à ampliação dos prazos para o pagamento das dívidas e ao deságio, apresentando soluções que se mostram, muitas vezes, incapazes de permitir a reestruturação necessária à efetiva superação da crise.

Outra dificuldade identificada refere-se à organização e preparação do Poder Judiciário em âmbito nacional, mostrando-se imprescindível a criação de varas especializadas, diante da reconhecida especificidade e complexidade da matéria, que gera controvérsias até mesmo entre os mais experientes especialistas. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo possui uma Câmara Reservada à Falência e Recuperação, não obstante, referida Câmara já alterou seu posicionamento sobre algumas questões da recuperação judicial (v.g. recorribilidade da decisão que defere o processamento da recuperação judicial – Ag.I. 6041604800, reserva de 40% da remuneração do administrador judicial – Ag.I. 6876964000) e apresenta entendimento conflitante com o do Superior Tribunal de Justiça sobre importante tópico da lei, conforme será apresentado no presente artigo. Esses fatos demonstram toda a complexidade do tema.
No mesmo sentido, destaca-se a importância do Administrador Judicial, que se mostra essencial como órgão auxiliar do juiz no processo de recuperação judicial, devendo ser profissional idôneo e profundo conhecedor do Direito Empresarial, a fim de contribuir para o seguro e correto desenvolvimento do processo.
A atuação dos credores também se apresenta como um obstáculo ao êxito da recuperação judicial. Muitas vezes, a simples omissão dos credores em participar das assembleias gerais permite ajustes nos planos por aqueles credores que conduzem a recuperação segundo os seus próprios interesses. Embora a lei busque a participação ativa dos credores na recuperação, o que se verifica é a inibição dos credores em participarem ativamente dos processos de recuperação. A ausência da constituição do Comitê de Credores, indicado para as recuperações mais complexas, além do custo e da responsabilidade dos seus membros, também decorre do desinteresse dos credores.
Em relação aos efeitos decorrentes da distribuição da recuperação judicial, a maior dificuldade enfrentada pela recuperanda é o acesso ao crédito. O pedido de recuperação resulta na imediata e intransponível restrição ao crédito à recuperanda, justamente no momento em que mais se precisa dele. Nem mesmo os bancos oficiais concedem crédito à recuperanda, diante da insuperável análise de riscos, que trava o sistema e impede a liberação do crédito.
Se não bastasse à restrição ao crédito imposta à recuperanda, os contratos de execução continuada celebrados pela recuperanda que permitem o acesso ao crédito, como o contrato de desconto bancário, são extintos pela simples apresentação do pedido de recuperação judicial, ainda que não exista qualquer inadimplemento. É comum nesses contratos a previsão do pedido de recuperação judicial do contratante como causa de resolução contratual. O ilustre jurista Jorge Lobo, ao tratar da questão, assevera que "a ação de recuperação judicial não é causa de resilição unilateral de contrato assinado com o devedor, mesmo que haja cláusula resolutória expressa prevendo a denúncia em caso de recuperação judicial ou falência" (LOBO, 2007, p.137).
A Lei n° 11.101/2005, objetivando estimular os credores da recuperanda a continuarem a negociar com ela, bem como incentivar o surgimento de novos parceiros comerciais, prevê no art. 67 que os créditos decorrentes de obrigações contraídas pela recuperanda durante a recuperação judicial, inclusive os referentes às despesas com fornecedores de bens ou serviços e contratos de mútuo, são considerados extraconcursais em caso de decretação de falência, respeitada a ordem prevista no art. 83.
Referido dispositivo, em seu parágrafo único, estabelece ainda que os créditos quirografários sujeitos à recuperação judicial pertencentes a fornecedores de bens ou serviços que continuarem a provê-los normalmente após o pedido de recuperação judicial terão privilégio geral de recebimento em caso de decretação de falência, no limite do valor dos bens ou serviços fornecidos durante o período de recuperação.
Se por qualquer motivo a recuperação judicial convolar-se em falência, os credores posteriores à distribuição do pedido serão reclassificados. Além de garantir o recebimento prioritário dos créditos extraconcursais, a lei eleva os créditos quirografários anteriores ao ajuizamento da ação de recuperação judicial à categoria de créditos com privilégio geral, estabelecendo como limite o valor dos bens ou serviços fornecidos durante o processo de recuperação.
No caso, se o credor quirografário detinha crédito de R$200.000,00 na data do pedido inicial e durante o processo de recuperação firmou contratos no valor de R$100.000,00, terá direito, no caso de decretação da falência da recuperanda, à reclassificação de parte de seu crédito originário, passando então a credor quirografário por R$100.000,00 e a credor com privilégio geral por R$100.000,00, além de credor extraconcursal pelo que não houver recebido durante a recuperação (LOBO, 2007, p.196).
Fábio Ulhoa Coelho ressalta que a reclassificação em questão alcança apenas os créditos negociais, os tributos devidos em razão de fatos geradores ocorridos durante a tramitação da recuperação judicial decorrem da lei, o credor tributário não está assumindo conscientemente um risco. Não há, por isso, motivos para reclassificar os créditos fiscais, como qualquer outro derivado da lei, como responsabilidade civil por ato ilícito ou responsabilidade objetiva (COELHO, 2005, p.181).
Conforme se observa, o legislador buscou meios de incentivar a celebração de negócios com a recuperanda durante a recuperação judicial, entretanto, diante do risco acentuado de quebra previsto pelos credores, a recuperanda tem o crédito imediatamente cancelado no setor financeiro e encontra dificuldades para a obtenção de prazo de pagamento perante os fornecedores de produtos e serviços. A restrição ao crédito no setor financeiro e a dificuldade de concessão de prazo para pagamento junto aos fornecedores, constituem, no âmbito operacional, as maiores dificuldades identificadas para as sociedades empresárias em recuperação judicial, mostrando-se imprescindível a criação premente de uma linha de crédito especial para os devedores em recuperação judicial.

2. O delineamento da recuperação judicial

A recuperação judicial corresponde a um benefício legal à disposição do empresário individual e da sociedade empresária em crise que exploram regularmente a atividade econômica há mais de dois anos. Objetiva a superação da crise empresarial, permitindo a continuidade da atividade econômica para evitar a falência, tendo por finalidade, nos termos do art. 47 da Lei n° 11.101/2005, a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e do interesse dos credores no intuito de promover a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
O processo de recuperação judicial é promovido por iniciativa do próprio empresário em crise, que apresenta perante o Poder Judiciário o pedido do benefício. Verificando o atendimento a todos os requisitos legais, o juiz defere o processamento da recuperação judicial, abrindo-se prazo para os credores realizarem as habilitações de crédito perante o administrador judicial e para o devedor apresentar o plano de recuperação judicial.
Neste plano, o devedor apresentará os meios que serão utilizados para a superação da crise. Normalmente o plano prevê a dilação para o pagamento das dívidas, redução no valor a ser pago, venda de filiais, estratégias comerciais e administrativas, dentre outros meios apresentados, em caráter exemplificativo, no art. 50 da lei de regência. Ressalta-se que, com exceção das dívidas trabalhistas, na recuperação judicial comum não há limite legal para a dilação no pagamento das dívidas, existindo casos em que a previsão de pagamentos supera amplamente o prazo de cinco anos. Não resta dúvida que os meios de recuperação previstos no plano impõem sacrifícios aos credores, sendo, muitas vezes, a única forma que alguns deles possuem para garantir o recebimento dos seus créditos.
O plano de recuperação judicial é submetido à apreciação dos próprios credores que, diante da apresentação de objeções consistentes ao plano, provocam a convocação da Assembleia Geral de Credores para a realização da sua análise, que poderá determinar a sua aprovação, modificação ou rejeição. A rejeição do plano implica na determinação legal da convolação da recuperação judicial em falência, o que, de certa forma, conduz a sua aprovação pelos credores ou a apresentação de alterações ao plano, sujeitas a anuência expressa da recuperanda.
Interferências no projeto de lei durante a sua tramitação no Congresso Nacional afastaram da recuperação judicial as dívidas decorrentes de contratos de arrendamento mercantil (leasing), de alienação fiduciária e de adiantamento de contrato de câmbio para exportação, dentre outras previstas no art. 49 da Lei n° 11.101/2005. Durante o prazo de 180 dias, contados do deferimento do processamento da recuperação judicial, é vedada a retirada do estabelecimento da recuperanda dos bens de capital essenciais ao exercício da atividade empresarial, existindo decisões ampliando esse prazo para assegurar a preservação da empresa.
Não havendo objeções dos credores ou aprovado o plano de recuperação judicial pela Assembleia Geral de Credores, a recuperanda deve apresentar certidões negativas de débitos tributários para permitir o deferimento da recuperação judicial. Diante da notória dificuldade no atendimento à exigência legal, vista como sanção política, a recuperação judicial vem sendo deferida sem a exigência prevista, conforme entendimento jurisprudencial.
Deferida a recuperação judicial, a recuperanda e os credores sujeitos ao plano ficam vinculados ao seu cumprimento, ingressando o processo de recuperação judicial no período de observação de dois anos, em que o juiz, o administrador judicial e o comitê de credores, caso exista, fiscalizam o cumprimento das obrigações pela recuperanda. Durante este período, a recuperação judicial transforma-se em falência no caso de descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano pela recuperanda.
O fim do período de observação de dois anos determina o encerramento do processo de recuperação judicial. Caso o plano apresente obrigações com o cumprimento previsto para após o encerramento do processo, hipótese frequente, referidas obrigações continuarão sob a fiscalização dos credores, constituindo o plano de recuperação judicial título executivo judicial. O cumprimento de todas as obrigações previstas no plano pela recuperanda assegura o êxito da recuperação judicial, promovendo a preservação da empresa e a sua função social.

3. As controvérsias identificadas nos cinco anos de recuperação judicial

Ao longo dos cinco anos de aplicação da Lei n° 11.101/2005, em relação à recuperação judicial foi possível a identificação de vários pontos controversos, que muitas vezes surgem pelo fato da questão não se encontrar disciplinada de forma específica na lei, outras vezes em decorrência da necessária interpretação sistemática de seus artigos com a finalidade de assegurar o pleno êxito da recuperação judicial, nos termos do art 47, diante das alterações introduzidas no projeto de lei por influência do setor financeiro.
Diante dos inúmeros pontos controvertidos e polêmicos, não será possível a apresentação e análise de todos no presente artigo. Questões referentes à cessão fiduciária de créditos e a liberação das travas bancárias, possibilidade de inclusão no plano de recuperação judicial dos créditos financeiros excluídos pelo art. 49, §§3° e 4º, remuneração do administrador judicial e a reserva de 40%, cessão de crédito e direito de voto, novação recuperacional, representação dos credores trabalhistas na assembleia geral de credores, prorrogação dos prazos previstos na lei, nulidade ou anulabilidade das deliberações dos credores ou da Assembleia Geral de Credores, abuso do direito de voto, juízo universal da recuperação judicial e o conflito de competência, bloqueio on line, dentre outros pontos polêmicos, embora aqui mencionados, não serão abordados nesta oportunidade, ficando apenas consignados.
Dentre os pontos controvertidos identificados, são apresentados na sequência: a) possibilidade do litisconsórcio ativo na recuperação judicial; b) sujeição do produtor rural à recuperação judicial; c) definição do valor do bem dado em garantia real para a definição do voto na assembleia geral de credores; d) possibilidade da ampliação do prazo de 180 dias para assegurar a manutenção dos bens essenciais no estabelecimento da recuperanda nos contratos de alienação fiduciária e de arrendamento mercantil; e) apresentação de objeção e a convocação da assembleia geral de credores; e f) efeitos da recuperação judicial em relação aos coobrigados.

3.1. Litisconsórcio ativo na recuperação judicial

A Lei n° 11.101/2005 não trata da possibilidade do pedido de recuperação judicial apresentado por mais de um devedor, entretanto, são inúmeros os casos de litisconsórcio ativo em recuperação judicial. Ao tratar do tema, Ricardo Brito Costa conclui:
"A formação do litisconsórcio ativo na recuperação judicial, a despeito da ausência de previsão na Lei n° 11.101/2005, é possível, em se tratando de empresas que integrem um mesmo grupo econômico (de fato ou de direito). Nesse caso, mesmo havendo empresas do grupo com operações concentradas em foros diversos, o conceito ampliado de ‘empresa’ (que deve refletir o atual estágio do capitalismo abrangendo o ‘grupo econômico’), para os fins da Lei n° 11.101/2005, permite estabelecer a competência do foro do local em que se situa a principal unidade (estabelecimento) do grupo de sociedades. O litisconsórcio ativo, formado pelas empresas que integram o grupo econômico, não viola a sistemática da Lei n° 11.101/2005 e atende ao Princípio basilar da Preservação da Empresa. A estruturação do plano de recuperação, contudo, há de merecer cuidadosa atenção para que não haja violação de direitos dos credores" (COSTA, 2009, P. 182)
No caso de grupo de empresas, não há na lei previsão que obrigue a presença de todas as sociedades empresárias integrantes do grupo econômico no processo de recuperação judicial, que pode abranger uma ou algumas delas. No caso, o litisconsórcio formado no pólo ativo da recuperação judicial será facultativo, constituindo-se de acordo com a vontade das partes.
A opção das devedoras pelo litisconsórcio ativo exige a apresentação de um único plano de recuperação judicial e submete todas as sociedades empresárias às conseqüências decorrentes da sua aprovação ou rejeição. Nesse sentido, se por um lado a aprovação do plano beneficia todas as sociedades empresárias integrantes do grupo, havendo a rejeição do plano, ou outra hipótese prevista no art. 73 que determine a convolação da recuperação judicial em falência, todas as sociedades empresárias integrantes do litisconsórcio estarão sujeitas à sentença de falência e às conseqüências decorrentes.
A possibilidade do litisconsórcio ativo na recuperação judicial, quando afastada, fundamenta-se na regra de competência presente no art. 3° da Lei n° 11.101/2005, que define como competente para o deferimento da recuperação judicial o Juízo do local do principal estabelecimento do devedor. Por se tratar de regra de competência absoluta, não admite prorrogação voluntária.
De acordo com a regra de competência, a jurisprudência tem negado a formação do litisconsórcio ativo na recuperação judicial na hipótese das sociedades empresárias não possuírem o principal estabelecimento no mesmo foro. Conforme se verifica nas seguintes decisões da Câmara Reservada à Falência e Recuperação, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
"Agravo de instrumento. Recuperação judicial requerida em litisconsórcio por duas sociedades empresárias distintas, cada uma delas com sede social em comarcas diversas. Alegação de serem integrantes do mesmo grupo econômico. Decisão que determina a emenda da inicial em razão da inviabilidade do litisconsórcio ativo. Natureza contratual da recuperação judicial que impõe se facilite a presença dos credores na assembleia-geral para examinar o plano da devedora. A distância entre os estabelecimentos principais das empresas requerentes causa dificuldades incontornáveis à participação dos credores, notadamente os trabalhadores, nos conclaves assembleares realizados em comarcas distintas. Princípio da preservação da empresa e da proteção aos trabalhadores, ambos de estatura constitucional que, se em conflito, devem ser objeto de ponderação para a prevalência do mais importante. Tutela dos trabalhadores em razão da hipossuficiência. Manutenção da decisão que repeliu a possibilidade do litisconsórcio ativo no caso vertente, mantida a possibilidade da emenda da inicial para que cada uma das empresas requeira a medida recuperatória individualmente, observada a regra da competência absoluta do art. 3o, da LRF. Precedente da Câmara. ‘Manutenção da liminar para obstar a suspensão do fornecimento de serviços de telefonia por débitos anteriores ao requerimento da recuperação, que se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial. Agravo provido, em parte, revogado o efeito suspensivo, com determinação de imediato processamento da recuperação judicial’. (TJSP, Ag. I. n° 6453304400. Câmara Reservada à Falência e Recuperação. Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças. DJ 15.09.2009).
"Apelação. Recuperação Judicial requerida em litisconsórcio por três sociedades empresárias distintas, cada uma delas com sede social em Estados diversos da Federação (São Paulo, Minas Gerais e Bahia). Alegação de serem integrantes do mesmo grupo econômico. Deferimento do processamento da recuperação judicial. Posterior constatação da inviabilidade do processamento da medida em litisconsórcio ativo, em face da existência de credores distintos, domiciliados em Estados diferentes. Reconhecimento da incompetência absoluta do juiz requerida inicialmente a recuperação judicial. Extinção do processo, sem resolução do mérito, por força do indeferimento da inicial. Matéria de ordem pública, sobre a qual não ocorre preclusão nas instâncias ordinárias. Soberania da assembleia-geral de credores restrita à deliberação sobre o plano de recuperação judicial, mas não sobre pressupostos ou condições da ação. Natureza contratual da recuperação judicial que impõe se facilite a presença dos credores na assembleia-geral para examinar o plano da devedora. A grande distância entre os estabelecimentos principais das empresas requerentes causa dificuldades incontornáveis à participação dos credores, notadamente os trabalhadores, nos conclaves assembleares realizados em Estados diversos da Federação. Princípio da preservação da empresa e da proteção aos trabalhadores, ambos de estatura constitucional que, se em conflito, devem ser objeto de ponderação para a prevalência do mais importante. Tutela dos trabalhadores em razão da hipossuficiência. Extinção do processo de recuperação judicial, sem resolução do mérito, mantida, situação que não impede que cada uma das empresas requeira a medida recuperatória individualmente, observada a regra da competência absoluta do art. 3o, da LRF. Apelo das empresas desprovido. Apelação de credora que se insurgiu contra o processamento da recuperação no juízo original. Pretensão à condenação das devedoras em honorários advocatícios. Inviabilidade. Inteligência do art. 5o, II, da Lei n° 11.101/2005. Não incidência de honorários sucumbenciais na recuperação judicial extinta. Apelo da credora improvido." (TJSP. Apelação sem Revisão n° 6252064200. Câmara Reservada à Falência e Recuperação. Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças. DJ 09.06.2009)
3.2. A recuperação judicial e o produtor rural

De acordo com o art. 1° da Lei n° 11.101/2005, a Lei disciplina a recuperação judicial, a falência e a recuperação extrajudicial do empresário e da sociedade empresária. O art. 966 do Código Civil de 2002 define empresário de acordo com a teoria italiana da empresa, prevendo:
"Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa"
Por sua vez, o art. 982 do referido diploma legal define sociedade empresária:
"Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e , simples, as demais.
Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa."
De acordo com o tratamento previsto no Código Civil de 2002, que tem como base o Código Civil italiano de 1942, quem se dedica à atividade rural poderá ingressar no regime empresarial por opção, mediante a realização do arquivamento no Registro Público de Empresas, a cargo das Juntas Comerciais. Nesse sentido, o art. 971 do Código Civil:
"Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro."
Conforme se verifica, o produtor rural possui a opção de ingressar no regime empresarial e, fazendo essa opção por meio do arquivamento na Junta Comercial, fica equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito ao registro (entenda-se o descrito no art. 966, CC 2002). Estando equiparado ao empresário, estará sujeito a todas as obrigações previstas aos empresários, sujeitando-se à falência e aos seus efeitos, inclusive no âmbito penal. Por outro lado, gozará de todos os benefícios previstos aos empresários, podendo requerer recuperação judicial e extrajudicial.
De acordo com ordenamento jurídico vigente, para o produtor rural obter o deferimento do processamento da recuperação judicial precisará ter optado pelo regime empresarial, por meio do arquivamento na Junta Comercial. A ausência do arquivamento no Registro Público de Empresas afasta do produtor rural a possibilidade da recuperação judicial, já que nesse caso não se enquadra no art. 1° da Lei n° 11.101/2005, conforme dispõe o art. 971 c/c o art. 966 do diploma civil. Além disso, o produtor rural que não realizou a opção pelo regime empresarial não preenche os requisitos previstos no art. 51 da Lei n° 11.101/2005, notadamente o previsto no inciso V (certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas).
Nesse sentido, as seguintes decisões:
"Recuperação judicial. Ação ajuizada por produtores rurais que não estão registrados na Junta Comercial. ‘O empresário rural será tratado como empresário se assim o quiser, isto é, se se inscrever no Registro das Empresas, caso em que será considerado um empresário, igual aos outros’. ‘A opção pelo registro na Junta Comercial poderá se justificar para que, desfrutando da posição jurídica de empresário, o empresário rural possa se valer das figuras da recuperação judicial e da recuperação extrajudicial, que se apresentam como eficientes meios de viabilizar a reestruturação e preservação da atividade empresarial, instrumentos bem mais abrangentes e eficazes do que aquele posto à disposição do devedor civil (concordata civil - Código de Processo Civil, artigo 783)’. Só a partir da opção pelo registro, estará o empresário rural sujeito integralmente ao regime aplicado ao empresário comum. Sentença mantida. Apelação não provida. (TJSP. Apelação n° 994092930317. Câmara Reservada à Falência e Recuperação. Rel. Des. Romeu Ricupero. DJ 06.04.2010)
"Agravo de instrumento. Recuperação judicial. Pedido formulado por produtor rural não inscrito na Junta Comercial. Conhecimento de agravo tirado contra decisão que defere o processamento da recuperação judicial. Decisão que reconhece que o produtor rural é empresário rural inscrito no CNPJ e tem legitimidade para requerer a recuperação. Precedente do STJ que admite a recorribilidade da decisão que examina a legitimidade ativa do requerente da recuperação judicial. Produtor rural que não se vale da faculdade do art. 971 do Código Civil não é equiparado a empresário para os fins do art. 1o da Lei n° 11.101/2005 e não atende ao requisito do art. 48 do mesmo diploma legal. A inscrição do produtor rural no CNPJ-Receita Federal, não o equipara a empresário para fins do direito à recuperação judicial. Agravos conhecidos e providos para reformar a decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial. Extinção do processo de recuperação judicial, sem resolução de mérito, com base no art. 267, I, do CPC." (TJSP. Ag. I. n° 6481984200. Câmara Reservada à Falência e Recuperação. Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças. DJ 15.09.2009)
Em relação ao arquivamento do produtor rural na Junta Comercial a fim de atender às exigências legais e obter o deferimento do processamento da recuperação judicial, questiona-se a possibilidade do produtor rural realizar a opção imediatamente antes da apresentação do pedido de recuperação judicial. Nessa hipótese, considera-se o período de desenvolvimento da atividade como produtor rural sem registro na Junta Comercial para atender ao requisito previsto no art. 48 da Lei n° 11.101/2005, que exige o exercício regular da atividade econômica há mais de 2 anos?
O Tribunal de Justiça de São Paulo já sinalizou a possibilidade no caso de grupo empresarial, conforme se verifica abaixo, resta saber se o mesmo entendimento será adotado para a atividade econômica desenvolvida antes do arquivamento na Junta Comercial como produtor rural.
"Agravo de Instrumento. Recuperação judicial. Pronunciamento judicial que apenas defere o processamento da recuperação judicial. Recurso pretendendo a revogação do deferimento, sob a alegação central de não exercício regular da atividade empresária pela recuperanda há mais de dois anos no momento do pedido. Ato que tem a natureza de decisão interlocutória com potencial para causar gravame aos credores e terceiros interessados, além de poder afrontar a lei de ordem pública. Alteração do entendimento que proclamava a irrecorribilidade do ato previsto no artigo 52 da Lei n° 11.101/2005. Agravo conhecido. Falta de recolhimento do porte de retorno equivalente a preparo incompleto, que não autoriza a imediata aplicação da deserção, configurada hipótese de insuficiência. Agravante que, intimado, complementa do preparo com o recolhimento do porte de retorno. Deserção não reconhecida. O requisito do artigo 48, ‘caput’, da Lei n° 11.101/2005, ‘exercício regular das atividades empresariais há mais de dois anos no momento do pedido de recuperação judicial’, não exige inscrição na Junta Comercial por tal período mínimo. Integrando a requerente da recuperação judicial grupo econômico existente há 15 anos, e sendo constituída há menos de dois anos mediante transferência de ativos das empresas do grupo para prosseguir no exercício de atividade já exercida por tais empresas, é de se ter como atendido o pressuposto do biênio mínimo de atividade empresarial no momento do pedido. Agravo conhecido e desprovido, mantida a decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial" (TJSP. Ag. I. 6041604800. Câmara Reservada à Falência e Recuperação. Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças. DJ 04.03.2009)

3.3. A definição do valor do bem gravado e o voto do credor com garantia real na análise do plano de recuperação judicial

Uma questão que desperta interesse na definição dos votos na Assembleia Geral de Credores é a do credor com garantia real, que na análise do plano de recuperação judicial, nos termos dos arts. 41 e 45 da Lei n° 11.101/2005 vota na classe II (credores com garantia real) até o limite do valor do bem dado em garantia, votando na classe III (credores quirografários, privilégio especial, privilégio geral, subordinados) pelo valor que excede o limite de garantia.
Para a votação do plano de recuperação judicial o art. 45 estabelece o sistema da dupla maioria, dividindo os credores em três classes, previstas no art. 41. Nas classes II (credores com garantia real, até o limite do bem gravado) e III (credores quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados, credores com garantia real pelo valor que excedeu a garantia), a proposta deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes. Na classe I (credores trabalhistas ou decorrentes de acidente do trabalho), a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor do crédito.
O quadro abaixo demonstra a divisão dos credores e os quoruns exigidos para a aprovação do plano de recuperação judicial:
QUORUM DE APROVAÇÃO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Art. 45

Classe de Credores
(art. 41)

Natureza do crédito

Voto
Quantitativo
(n° de credores)

Voto
Qualitativo
(valor crédito)

Quorum de deliberação

Classe I

Trabalhistas
(sem limite) e acidentários

Maioria simples (mais da metade dos credores presentes)

(NÃO)
Não se considera o valor dos créditos desta classe

Somente por cabeça:
maioria simples

Classe II

Garantia real (até o limite da garantia)

Maioria simples
(mais da metade dos credores presentes)

Maioria simples
(mais da metade do valor total dos créditos desta classe presentes na AGC )

Por cabeça:
maioria simples
Por crédito:
maioria simples

Classe III

Quirografários – Privilégio geral- Privilégio especial – Subordinados e credores com garantia real ao que excedeu o limite de garantia

Maioria simples
(mais da metade dos credores presentes)

Maioria simples
(mais da metade do valor total dos créditos desta classe presentes na AGC)

Por cabeça:
maioria simples
Por crédito:
maioria simples
Conforme se verifica, o credor com garantia real vota na classe II até o limite do valor do bem gravado, votando com os credores da classe III pelo valor do crédito que supera o valor do bem dado em garantia. Diante da divisão legal estabelecida, é importante definir o valor do bem dado em garantia na hipótese dele não ser manifestamente superior ao valor do crédito, já que o resultado referente à análise do plano na Assembleia Geral de Credores poderá depender da diferença apurada. Nesse contexto, constata-se que a legislação não prevê, de forma específica, o momento da definição do valor do bem dado em garantia, nem mesmo o critério a ser utilizado.
De acordo com o art. 9°, II, da Lei n° 11.101/2005, a habilitação de crédito deverá conter "o valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de recuperação judicial, sua origem e classificação". Na falência, o art. 83, §1°, estabelece que o valor do bem gravado corresponderá à importância efetivamente arrecadada com a sua venda, ou, no caso de alienação em bloco, o valor de avaliação do bem individualmente considerado.
Ao tratar do voto do credor na Assembleia Geral de Credores, o art. 38, parágrafo único, determina que para fins exclusivos de votação em assembleia, o crédito em moeda estrangeira será convertido para moeda nacional pelo câmbio da véspera da data da realização da assembleia.
Nesse contexto, parece que a melhor solução é a realização da avaliação do bem gravado pelo valor de mercado, considerando a data da distribuição do pedido de recuperação judicial. Estabelecido o momento para a realização da avaliação, surge outra questão, a quem compete a realização da avaliação: ao credor com garantia real, à recuperanda ou ao administrador judicial?
Nos termos do art. 9°, II, caberia ao credor com garantia real apresentar a avaliação do bem no momento da habilitação do crédito, mediante a apresentação de laudo fundamentado elaborado por empresa especializada ou por profissional legalmente habilitado. Entretanto, não há previsão legal específica para a respectiva exigência e a avaliação do bem realizada pelo próprio credor beneficiário não se mostra adequada ao caso.
Outra solução possível para o caso é a realização da avaliação pelo próprio administrador judicial. A exemplo do que ocorre na falência, nos termos do art. 108 da Lei n° 11.101/2005, caberia ao administrador judicial proceder à avaliação do bem gravado e, não se encontrado habilitado para fazê-lo, contrataria avaliadores, de preferência oficiais, mediante autorização judicial, conforme disposto no art. 22, III, "h", da lei de regência. Nessa hipótese, o laudo de avaliação deve ser apresentado juntamente com a relação de credores prevista no art. 7°, §2°, a fim de permitir a manifestação dos interessados antes da realização da Assembleia Geral de Credores.
Ressalta-se, ainda, o disposto no art. 53, III, da Lei n° 11.101/2005, prevendo que o plano de recuperação judicial deverá conter "laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada." De acordo com referido dispositivo, os valores dos bens do devedor são definidos no plano de recuperação e ficam sob a responsabilidade da recuperanda.
No caso, o valor constante no laudo de avaliação subscrito por profissional legalmente habilitado ou por empresa especializada, desde que estabeleça avaliação individual para os bens da recuperanda, poderá ser o documento utilizado para atender ao disposto no art. 41, § 2°, da Lei n 11.101/2005. Entretanto, o que se verifica nos casos concretos é a apresentação de uma avaliação global de bens por espécie.
Seja qual for o entendimento a ser adotado pela jurisprudência, a avaliação conferida ao bem sempre estará sujeita à impugnação por qualquer interessado. No caso do bem gravado apresentar valor manifestamente superior ao valor do crédito, a definição do critério, da forma e do momento da avaliação perde a importância, já que o voto do credor, nesse caso, será considerado apenas na classe II pelo valor do seu crédito. Dentre as hipóteses apresentadas, parece que a avaliação realizada pelo administrador judicial, mediante a contratação de avaliadores oficiais, mostra-se como a solução mais segura ao caso, cabendo à jurisprudência a definição.

3.4. Os créditos excluídos da recuperação judicial e a possibilidade da manutenção do bem objeto de alienação fiduciária ou de arrendamento mercantil na posse da recuperanda após o prazo de 180 dias

A Lei n° 11.101/2005, em atendimento aos interesses das instituições financeiras, exclui da recuperação judicial alguns créditos de origem financeira, conforme se observa no art. 49, §3°:

"Art. 49.
§3°. Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o §4° do art. 6° desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial."
Ao comentar o art. 49, §3°, assevera Manoel Justino Bezerra Filho:
"Esta disposição foi o ponto que mais diretamente contribuiu para que a Lei deixasse de ser conhecida como ‘lei de recuperação de empresas’ e passasse a ser conhecida como ‘lei de recuperação do crédito bancário’, ou ‘crédito financeiro’, ao estabelecer que tais bens não são atingidos pelos efeitos da recuperação judicial. (...)
Ficará extremamente dificultada qualquer recuperação, se os maquinários, veículos, ferramentas, etc. com os quais a empresa trabalha e dos quais depende para seu funcionamento, forem retirados."
(BEZERRA FILHO, 2005. p. 136)
De acordo com o art. 49, §3° c/c o art. 6°, §4°, da Lei n° 11.101/2005, com o deferimento do processamento da recuperação judicial verifica-se a suspensão das ações e execuções em face da Recuperanda, sendo vedado, no prazo de 180 dias, a retirada do estabelecimento da Recuperanda de bens de capital essenciais à atividade empresarial.
Durante o prazo previsto, a lei assegura que a Recuperanda seja mantida na posse do bem essencial ao desenvolvimento da empresa. No caso, é evidente que o prazo legal de 180 dias é extremamente exíguo e insuficiente para qualquer superação de crise que tenha exigido o pedido de recuperação judicial e causado a suspensão dos pagamentos.
Analisado de forma isolada, o prazo legal de 180 dias mostra-se improrrogável. Entretanto, tratando-se de bem de capital essencial ao desenvolvimento da atividade empresarial pela Recuperanda, a retirada do bem do seu estabelecimento poderia impedir que a finalidade da recuperação judicial fosse alcançada de forma efetiva, frustrando-se o art. 47 da Lei n° 11.101/2005.
Diante das dificuldades decorrentes da aplicação dos arts. 49, §3° e 6°, §4°, da lei de regência, que colocam em risco o êxito da recuperação judicial no país, existem decisões judiciais e entendimentos doutrinários que não admitem a retirada dos bens essenciais da Recuperanda, mesmo após o decurso do prazo de 180 dias.
Justifica-se esse posicionamento com base no art. 47 da Lei n° 11.101/2005, que corresponde ao artigo mais importante da legislação, conforme amplamente divulgado pelos especialistas no tema. Referido dispositivo legal determina a finalidade da recuperação judicial a partir de princípios indicados pelo legislador, conforme se observa:
"Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica".
A relevância do art. 47 encontra-se expressada por Newton de Lucca da seguinte forma:
"Trata-se do artigo que instituiu a maior novidade da NLF. Pode-se dizer, em certo sentido, que ele traduz o espírito que terá enfornado toda a nova disciplina jurídica que acaba de ser dada à estampa em fevereiro do corrente ano de 2005."
(DE LUCCA, 2005. p.202)
Calixto Salomão Filho, ao se referir à Lei n° 11.101/2005, conclui:
"Pressupõe e inclui princípios que não podem ser negados ou descumpridos, qualquer que tenha sido o grupo de interesses que mais influenciou sua elaboração. (...) é também necessário reconhecer que a recuperação de empresas pressupõe princípios e objetivos que não podem ser desconsiderados. O principal deles é o da preservação da empresa, expressamente declarado no art. 47 da Lei 11.101/2005, de 9 de fevereiro de 2005 (nova Lei de Falências), como princípio da recuperação de empresas."
(SALOMÃO FILHO, 2007. p.42.)
O princípio da preservação da empresa foi expressamente aplicado pelo Superior Tribunal de Justiça no Conflito de Competência n° 79.170-SP. Na oportunidade, foi apreciado pelo STJ se o juízo diverso do da recuperação judicial teria competência para apreciar pedido de reintegração de posse contra a devedora, quando já transcorrido o prazo de 180 dias previsto na legislação.
No caso, a Corte entendeu que o art. 47 "estabelece, inequivocamente, o objetivo de preservar a supremacia do interesse público sobre o interesse privado", de forma que o destino do patrimônio da recuperanda "não pode ser afetado por decisão prolatada em juízo diverso do que é competente para a recuperação, sob pena de prejudicar o funcionamento do estabelecimento, comprometendo o sucesso do plano de recuperação, ainda, que ultrapassado o prazo de suspensão". Do contrário, estaria sendo violado o princípio da preservação da empresa, previsto expressamente no art. 47 da Lei n° 11.101/2005.
O julgado do Superior Tribunal de Justiça, acima indicado, é transcrito abaixo:
“CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. SUSPENSÃO DAS AÇÕES E EXECUÇÕES. PRAZO DE CENTO E OITENTA DIAS. USO DAS ÁREAS OBJETO DA REINTEGRAÇÃO PARA O ÊXITO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO.
1. O caput do art. 6º, da Lei 11.101/05 dispõe que "a decretação da falência ou deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário". Por seu turno, o § 4º desse dispositivo estabelece que essa suspensão "em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação".
2. Deve-se interpretar o art. 6º desse diploma legal de modo sistemático com seus demais preceitos, especialmente à luz do princípio da preservação da empresa, esculpido no artigo 47, que preconiza: "A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica".
3. No caso, o destino do patrimônio da empresa-ré em processo de recuperação judicial não pode ser atingido por decisões prolatadas por juízo diverso daquele da Recuperação, sob pena de prejudicar o funcionamento do estabelecimento, comprometendo o sucesso de seu plano de recuperação, ainda que ultrapassado o prazo legal de suspensão constante do § 4º do art. 6º, da Lei nº 11.101/05, sob pena de violar o princípio da continuidade da empresa. 
4. Precedentes: CC 90.075/SP, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 04.08.08; CC 88661/SP, Rel. Min, Fernando Gonçalves, DJ 03.06.08.
5. Conflito positivo de competência conhecido para declarar o Juízo da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central de São Paulo competente para decidir acerca das medidas que venham a atingir o patrimônio ou negócios jurídicos da Viação Aérea São Paulo - VASP. (STJ. CC 79170/SP. Rel. Min. Castro Meira. S1 Primeira Seção. DJ 10.09.2008)”
http://jus.uol.com.br/revista/texto/18380/os-primeiros-cinco-anos-da-recuperacao-judicial-no-pais

Tudo Sobre Dizimo


 Site bastante polêmico:  

http://www.adventistas.com/dizimos.htm

Dizimo Adventista


Quando Ellen White (mensageira da Igreja Adventista) e seus auxiliares chegaram aos Estados Unidos em 1900, após dez anos de permanência na Austrália, encontraram uma questão a ser resolvida: Onde ela se estabeleceria?
Pouco antes de chegar a São Francisco, ainda a bordo do navio, ela teve uma visão na qual lhe foi declarado que o Senhor havia preparado um refúgio para ela. Onde exatamente seria esse lugar não lhe foi apresentado. Como a Pacific Press, editora que imprimia os livros que ela escrevia, ficava em Oakland, Califórnia, parecia que Oakland devia ser o lugar escolhido. Mas os aluguéis haviam subido muito durante o período que ela havia estado fora. O aluguel de uma casa adequada custaria pouco mais da metade de seu salário.
Enquanto decidia foi-lhe sugerido que descansasse por alguns dias no retiro de saúde de Santa Helena. Lá, em conversa com velhos amigos, contou sua frustração em procurar uma casa em Oakland, quando um dos amigos disse: "Na base de um colina, bem próxima, há um perfeito lugar para a senhora. é a casa de Robert Pratt."
Robert havia comprado uma área de 30 mil metros quadrados, onde havia ricas terras de lavoura. Ellen White mal conseguia conter sua emoção. Na propriedade havia uma grande casa vitoriana inteiramente mobiliada, incluindo carpetes, cortinas, toalhas e louças. Havia árvores ornamentais de várias partes do mundo e muitas flores, a maioria rosas.
Um pomar estava formado com uma incrível variedade de árvores frutíferas. Havia um outro pomar contendo mil ameixeiras e outro, somente de oliveiras. Havia também um vinhedo, um jardim, um campo de feno, um celeiro, dois cavalos, quatro charretes e uma plataforma para carroças. O que mais alguém poderia desejar?
O chalé, perto da casa, poderia servir de escritório.
Havia várias nascentes, bosques e um cenário inigualável. Por essa propriedade, ela pagou um valor inferior ao recebido pela venda de sua casa na Austrália, e isso apenas uma semana após haver desembarcado. Deus realmente havia preparado um refúgio para ela.
Muitos também passam por experiências maravilhosas como essa. Deus realmente dirige os negócios, mesmo para comprar ou para alugar uma casa. Deus sempre prepara um refúgio para Seus filhos. às vezes, um aluguel menor, outras vezes uma casa melhor. Seja como for, podemos ter certeza de que Aquele que é o dono do mundo está ao nosso lado.
"Do Senhor é a terra e a sua plenitude; o mundo e aqueles que nele habitam." Salmo (VT) 24:1. Costumamos dizer que possuímos uma casa ou terras, mas não é bem assim. Tudo é propriedade de Deus, nós somos apenas os administradores. Deus é quem nos torna possível adquirir todas as coisas.
"Antes te lembrarás do Senhor teu Deus, que Ele é o que te dá força para adquirires poder; para confirmar o Seu concerto, que jurou a teus pais, como se vê neste dia." Deuteronômio (VT) 8:18. Deus quer ser nosso amigo e não apenas isso. Ele quer prover nossas necessidades e nos dar um presente. "Porquanto a vontade dAquele que Me enviou é esta: que todo aquele que vê o Filho, e crê nEle, tenha a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia." São João (NT) 6:40.
Jesus quer dar a cada um de nós a vida eterna, um lar permanente. "Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: vinde, benditos de Meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo." São Mateus (NT) 25:34. Este é o presente que Ele nos quer dar, e mais do que isso, quer nos adotar em Sua família e finalmente nos receber para desfrutar as alegrias e privilégios de Seu reino. Enquanto esse dia não chegar, Ele nos pede, como inquilinos deste velho mundo, um aluguel bastante modesto. Na verdade, Ele pede que reconheçamos a Sua propriedade, devolvendo- Lhe uma pequena porção daquilo que Ele nos dá. E a todos que concordam com isso, Ele faz uma maravilhosa promessa.
"Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na Minha casa, e provai-Me nisto, diz o Senhor dos exércitos, se Eu não vos abrir as janelas do céu, e não derramar sobre vós bênção sem medida." Malaquias (VT) 3:10.
Deus nos dá tudo mas não pede tudo. Ele pede que devolvamos a apenas a décima parte, ou seja, o dízimo como Ele o define. Ele nos deixa ficar com os outros 90 por cento. Que acordo mais incrível! O que Deus promete àqueles que devolvem fielmente a porção que Deus designou como dEle?
Nosso Senhor abre as portas do Céu e faz chover bênçãos sobre nós, elas são tantas que não temos espaço para recebê-las.
Qualquer dizimista fiel dirá que Deus cumpre essa promessa. E nosso Pai promete fazer algo mais: "Por vossa causa repreenderei o devorador, para que não vos consuma o fruto da terra; a vossa vide no campo não será estéril, diz o Senhor dos Exércitos." Malaquias 3:11.
Os dizimistas podem contar muitas histórias de como o Senhor honrou fielmente Sua promessa. Repetidas vezes, Deus protege Seus filhos do devorador. Ele convida a cada um para formar uma maravilhosa sociedade com Ele. Evidentemente a aritmética de Deus não é igual a nossa. Os nove décimos com Sua bênção são mais que os dez décimos sem ela.
O dízimo é uma doação? Não. O dízimo é uma parte de nossa renda que claramente pertence a Deus. "Roubará o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e dizeis: em que Te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a Mim Me roubais, vós, a nação toda." Malaquias 3:8 e 9. Oferta é algo bem diferente do dízimo.
O que se deve fazer com o dízimo? Certamente, não podemos enviar um cheque para Deus. Alguns crêem que deva ser dado aos pobres ou a alguma instituição de caridade, mas esse não é o plano de Deus. Sua palavra é clara a esse respeito: "Trazei todos os dízimos à casa do tesouro." A nossa responsabilidade é levar o dízimo à igreja e é responsabilidade da igreja distribuí-lo sabiamente.
O apóstolo São Paulo diz qual é a finalidade do dízimo: "Assim ordenou também o Senhor aos que anunciam o evangelho, que vivam do evangelho." I Coríntios (NT) 9:14.
Na época do Velho Testamento, o dízimo era usado para o sustento dos sacerdotes; no Novo Testamento ele é empregado para o sustento do ministério evangélico. O ministro não deve depender das coletas, dos bazares beneficentes e nem das quermesses, para seu sustento. Ele não deve depender da boa vontade de algum membro rico. Pois o dízimo é trazido à casa do tesouro, para a tesouraria da igreja, e repassado para o sustento dos pastores, igualmente, quer a igreja seja grande ou pequena, quer os membros sejam pobres ou ricos. Deus sabe exatamente como prover Sua obra.
Um homem estava estudando a Bíblia e seus amigos ficaram surpreendidos com o seu entusiasmo. "Se você se envolver com essa igreja eles vão tirar dez por cento de seu salário." A denúncia pareceu bastante grave. Ele foi ao pastor para saber a verdade. Perguntou se igreja iria tirar dez por cento de sua renda. O pastor deu uma resposta singular: "Sim, é verdade que a igreja vai ficar com dez por cento de sua renda. Mas isso não é tudo, você vai ser convidado a dar ofertas além do seu dízimo. Se você tem filhos, a igreja vai querer que você os coloque em um colégio cristão e isso tem o seu preço. A igreja vai incentivá-los a enfrentar uma faculdade cristã e isso custa caro; mas ainda não é tudo. Pode ser que a igreja peça a você que mande seu filho para a áfrica ou qualquer outro lugar como missionário. Talvez você nunca mais volte a vê-lo. O Senhor não pede apenas dez por cento, Ele pede tudo o que você tem".
Realmente, Deus pede tudo o que você tem. Mas, diante do que Ele tem feito por você, diante do que o Calvário custou a Ele, é pedir demais?
Deus deseja fazer parte de sua vida por completo, não apenas do dinheiro, mas do seu tempo, suas habilidades, dos cuidados com a sua saúde, seu trabalho, seu casamento, suas esperanças e sonhos. Ele estende um convite a você para fazerem uma sociedade fascinante.
Agora você sabe que a Igreja Adventista do Sétimo Dia é dizimista. O seu povo é dizimista. Pergunte a qualquer adventista sobre como Deus tem cumprido a Sua promessa. Você terá uma surpresa.
Durante a recessão econômica dos anos 30 ocorreu uma história notável na sede mundial da Igreja Adventista em Washington. W. H. Williams era um bom diretor financeiro. Ele conhecia também a economia mundial. Em uma época difícil, quando as verbas eram escassas, ele era o homem certo para o posto que ocupava como vice-tesoureiro da Associação Geral. Ele era o homem ideal, não apenas por causa de sua formação e experiência mas porque sua fé pessoal em Deus era tanta que, mesmo em uma época de emergência, ele obedecia rigorosamente ao que Deus ordenava.
Em uma tarde de quinta-feira, ao se encerrar o expediente, Williams sentou-se sozinho em seu escritório. Estava feliz pela chance de relaxar após um dia atarefado. Como sua esposa estivesse fora, não havia problemas se ele se atrasasse alguns minutos. Pensou como seria bom ir para cama mais cedo e descansar. De repente, ele ouviu uma voz: "Vá a Nova Iorque esta noite." O pastor Williams era o tesoureiro responsável pelo fluxo do caixa. Era ele quem mexia com os bancos. Os fundos eram distribuídos por vários bancos e dois ficavam em Nova Iorque.
Ele ia freqüentemente a Nova Iorque enviar verbas para as missões. Mas ainda faltavam dez dias para isso. Ele se perguntou: "Ir a Nova Iorque esta noite?" Não tenho autoridade para mexer com os fundos nesta época. Então orou: "O que vou fazer, Senhor, quando chegar lá?" Mas a voz continuou: "Vá."
Ele estava cansado e detestava tomar o bonde tarde da noite para ir à ferroviária. Em seguida, foi à sala do seu fiel assessor, Chester Rogers, para ver se ele já havia ido para casa. Ele ainda não havia saído do trabalho e concordou em levá-lo até à ferroviária para tomar o trem da meia-noite.
Rogers não fez qualquer pergunta mas ficou curioso sobre o que estaria acontecendo. Por que o pastor Williams faria uma viagem não programada até Nova Iorque dez dias antes do prazo, e sem autorização? Havia algo estranho.
Durante algum tempo, Williams vinha retirando mil dólares de cada vez de um dos bancos em Washington. Em cada uma dessas vezes, ele havia simplesmente pedido a Rogers para colocar as dez notas de cem dólares em um envelope, datá-lo, marcar a quantia, e colocá-lo no cofre do escritório. Mas por quê? O próprio pastor Williams não sabia a razão.
Na manhã seguinte, chegou a Nova Iorque ainda sem saber por que estava lá. Mas logo veio a resposta: "Vá aos dois bancos e remeta o dinheiro para as missões." Ele argumentou com Deus em oração que ainda era muito cedo para tal operação. Quando os bancos abriram naquela sexta-feira, ele estava de frente para o caixa que geralmente cuidava dos negócios da Associação Geral. O homem nem sequer ergueu os olhos e o pastor Williams deu a ele uma lista das remessas a serem enviadas. Aconteceu ainda mais uma coisa estranha. De repente o pastor disse: "Eu gostaria de enviar o triplo da importância que sempre enviamos em cada caso." Ele sabia que havia o suficiente para uma remessa assim, mas iria ficar pouco dinheiro como fundo de reserva. Ele insistiu para que o caixa fizesse a transação rapidamente.
Antes de entrar e depois de sair do banco, o pastor Williams estava tremendo: como poderia explicar o que acabara de fazer sem autorizaço? Novamente ouviu a voz: "Vá ao outro banco e envie as demais verbas, agora." A voz parecia indicar que não havia tempo a perder. No segundo banco, tudo correu normalmente e recebeu a garantia de que a transação seria feita imediatamente. Telegrafou em seguida para cada uma das missões mundiais dizendo: Conserve verbas. Segue carta.
De volta, já em casa, ele acordou tarde na manhã seguinte. Era 4 de março - dia em que o novo predidente, Franklin D. Roosevelt, ia ser empossado. Através da janela aberta de seu quarto, ele ouviu um grito rouco: Extra! Extra! Bancos fechados em toda a nação. O Pastor Williams pulou da cama e correu para pegar um jornal. Era verdade, lá estava a manchete: Bancos fechados em toda a nação.
Agora ele sabia: o novo presidente só iria proclamar seu feriado bancário no dia seguinte. Mas na manhã de 4 de março, o dia da posse, Richard Whitney, presidente da Bolsa de Valores de Nova Iorque fez o histórico anúncio: A Bolsa fechou, por tempo indeterminado. O sistema bancário sofreu um colapso, a emergência era total, e a nação teria que se ajustar a um mundo sem dinheiro. Muitos pequenos bancos jamais voltaram a abrir e os que sobreviveram, só reabriram depois de três meses.
Muitos desastres e imprevistos de toda ordem ainda surgirão. Mas o que isso realmente significa diante de um Deus tão poderoso e cuidadoso assim?

O DÍZIMO NA IGREJA CATÓLICA APOSTÓLICA ROMANA


O INICIO DA PRÁTICA
A adesão da Igreja Católica Apostólica Romana a prática do dízimo está longe de ser uma novidade, foi iniciada com a queda do Império Romano, no século IV. A igreja ocupou o vazio do poder, e para evitar o caos financeiro, começou a cobrar o dízimo sob pena de excomunhão. No século VI, os concílios e sínodos da Igreja da França relembravam essa obrigação. O Bispo Graciano inseriu no decreto aos fiéis uma lista de bens sujeitos ao dízimo, redigida por Cesário de Arles e atribuída por ele a Santo Agostinho. O dízimo era devido por todos os participantes da igreja, até mesmo pelo rei e pela aristocracia.

O dízimo foi confirmado oficialmente pelos concílios regionais de Tours (567) e Mácon (585). Mas foi somente a partir de Carlos Magno (779) que o dízimo passou a ser cobrado regularmente. Ele generalizou e sancionou a prática. Dividiu o produto dos pagamentos em três partes iguais, destinada à igreja paroquial, ao pároco e aos pobres. Em princípio o bispo não deveria receber nada. Mas na verdade os bispos ficavam com uma parte, enquanto os abades e priores disputavam o dízimo sobre as terras de seu monastério, em detrimento do clero paroquial.

Por causa do controle laico dos bens e ganhos da Igreja nos séculos VIII e IX, os proprietários consideravam os dízimos parte integrante de seu domínio e, como tal, os submetiam a seus feudos. Parte considerável dos dízimos permaneceu submetida ao feudo até os tempos modernos, mesmo depois de a Reforma Gregoriana ter obrigado os senhores a entregar seus bens temporais as igrejas paroquiais.

Esse sistema tributário estendeu-se posteriormente às demais nações cristãs: chegou à Inglaterra no século X. Na península Ibérica os dízimos já eram praticados desde o século VII, em caráter voluntário, e somente 400 anos depois passa a ser obrigatório. Nos dois primeiros concílios de Latrão, em 1123 e 1139, o dízimo foi finalmente incorporado à legislação geral da igreja, de forma definitiva, como a décima parte da renda dos fiéis.

Os dízimos foram uma das principais atribuições das jurisdições eclesiásticas no final da Idade Média, estiveram na origem de inúmeros conflitos entre a justiça eclesiástica e a real.

A VENDA DE INDULGÊNCIAS
A relação entre fé e dinheiro está presente na Igreja Católica desde os primórdios de sua institucionalização. Foi durante o governo do papa Inocêncio III (1198 – 1216) que a influência da Igreja na vida pública na Europa cristã atingiu seu ponto máximo. Na Idade Média, ela se tornou o senhor feudal de grande parte da Europa. No entanto a forma de arrecadação mais ferrenha por parte do clero foi marcada pela venda das absurdas cartas de indulgência - pagamento em dinheiro pelo perdão de pecados, de mortos ou vivos, que financiou, entre outros empreendimentos, a construção da Basílica de São Pedro em Roma.

A cobrança de tributos e a venda de indulgencias entre outras práticas, culminaram com vários protestos dentro da própria Igreja e acendeu a Reforma Protestante.

A PRÁTICA DO DÍZIMO NO BRASIL
Sempre houve algum regime de contribuição para a igreja no Brasil. O que acontecia é que dentro da sociedade estratificada, como no tempo do Brasil Imperial, a Igreja Católica estava associada às elites, que davam abastadas contribuições. Por esse motivo havia a impressão entre o “povão”, que a igreja não cobrava dízimos.

Até o fim do século XIX, a Igreja Católica vivia de doação das famílias nobres e da contribuição fiscal do Estado. Com o advento do regime Republicano, veio à separação definitiva entre a Igreja e o Estado.

Com a propagação das idéias racionalistas, positivistas e a predominância de um sistema capitalista, a Igreja perdeu o apoio das elites, agora mais materialistas, e precisou buscar novas formas de arrecadação para manutenção de suas paróquias. Apenas a cobrança das espórtulas, uma espécie de doação ou esmola para a realização de missas de corpo presente, batismos e casamentos, entre outros serviços eclesiásticos, não cobriam as despesas paroquiais.

PUBLICAÇÕES SOBRE O DÍZIMO
As publicações católicas que se proliferam de maneira profícua sobre o dízimo, nem sequer constituiam um magistério da Igreja Católica. Não vem de Roma e nem são chanceladas pelo episcopado. Em geral, são os padres e leigos que escrevem tentando ajudar as comunidades a tratar do assunto e conscientizar o povo católico sobre a manutenção das igrejas. Foi observando o crescimento dessas práticas entre seus fieis, que a Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) criou a pastoral do dízimo para apoiar as comunidades na implantação do tributo espiritual. Muito embora o clero católico não demonstre habilidade no trato de assuntos financeiros com seus fieis, a adesão chega a 80% das paróquias paulistanas.

Mesmo assim, a adoção do dízimo ainda é visto com reservas por parte de alguns clérigos. A grande maioria não considera a prática ao pé da letra e prefere um discurso mais brando sobre arrecadação de fundos financeiros para a paróquia. Existe também a preocupação de alguns padres para que a cobrança do dízimo não seja uma imposição, pois dizem que assim seria voltar ao Velho Testamento, aos tempos da Lei de Moisés. 

A INFLUÊNCIA EVANGÉLICA NA COBRANÇA DO DÍZIMO
No entanto, a influência evangélica na prática atual é inegável. Em vários setores da Igreja Católica se prega o dízimo como devolução a Deus do que é recebido em ganhos e bens diversos. Na literatura católica sobre o dízimo há claramente um parentesco com os argumentos utilizados pelos evangélicos. 

CONCLUSÃO
Foi criado na sociedade a idéia de que só as Igrejas Evangélicas cobravam o dízimo de seus membros. Hoje a maioria das pessoas já sabe que todas as Igrejas vivem de ofertas e dízimos. Muitas vezes o nome da contribuição não é dízimo, aí dizem que a igreja tal, não cobra dízimos. Não importa o nome que seja adotado para a contribuição, o certo é que nenhuma igreja se mantém sem a ajuda financeira de seus membros ou associados. 

Fonte: Revista Eclésia

O Dizimo na Visão Espírita

O Antigo Testamento mostra que Abraão foi o iniciador do dízimo. Jacó foi o continuador. E, quatrocentos anos depois, com Moisés, o dízimo passou a ser um mandamento considerado sagrado, logo, um dever de todo o judeu.

Já o Novo Testamento não faz profundas referências a respeito do tema. Jesus, por exemplo, dizia sutilmente, (para não chocar os judeus) que mais importante que pagar o dizimo era moralizar as atitudes: "SE, POIS, AO TRAZERES AO ALTAR A TUA OFERTA, E ALI TE LEMBRARES DE QUE TEU IRMÃO TEM ALGUMA COISA CONTRA TI, DEIXA PERANTE O ALTAR A TUA OFERTA, VAI PRIMEIRO RECONCILIAR-TE COM TEU IRMÃO; E, ENTÃO, VOLTANDO, FAZE A TUA OFERTA.” (Mt. 5: 23 a 24). Aqui, por exemplo, vemos Jesus dizendo que antes de fazermos nossa oferta ou doação devemos nos reconciliar com nosso irmão de caminhada. Nada agrada mais a Deus do que ver Seus filhos vivenciando Seus ensinamentos trazidos por Jesus. “DAI A CÉSAR O QUE É DE CÉSAR (coisas materiais), E A DEUS O QUE É DE DEUS (coisas espirituais).”


Vejamos este outro exemplo: “AI DE VÓS, ESCRIBAS E FARISEUS, HIPÓCRITAS! POIS QUE DIZIMAIS A HORTELÃ, O COENTRO E O COMINHO, E DESPREZAIS O MAIS IMPORTANTE DA LEI, QUE É: O JUÍZO, A MISERICÓRDIA E A FÉ; DEVEIS, PORÉM, FAZER ESTAS COISAS, SEM DEIXAR AQUELAS.” (Mt 23.23a). Aqui Jesus explica novamente que não adianta pagarmos o dizimo, seja de que forma for, se deixarmos de lado o mais importante que é a “reforma íntima”, a moralização de nossos atos, pensamentos e palavras. Mas infelizmente, existem aqueles que exploram a boa fé das pessoas com promessas e recompensas extraordinárias. Ensinando os fiéis a barganhar com Deus. Isto faz com que alguns vejam o dizimo como uma moeda de troca ou obrigação. Além do mais, como podemos barganhar com Deus usando coisas que são Dele? Então, AFIRMAÇÕES COMO: "VOU DAR O DÍZIMO PARA NÃO FICAR DESEMPREGADO; VOU DAR O DIZIMO PARA NÃO FICAR DOENTE; VOU DAR O DÍZIMO PARA FICAR RICO”, são afirmações errôneas e contrárias aos ensinamentos de Jesus. O dizimo deve ser dado com gratidão sem se pensar em qualquer tipo de retorno da parte de Deus e não deve ser dado simplesmente por medo de não ser abençoado. Devemos observar que encontramos pessoas doentes e saudáveis, desempregados e empregados, pobres e ricos em todas religiões, pagando ou não o dízimo.


O apóstolo Paulo também falou sobre o dízimo e explicou que este deveria ser uma ação de amor, generosidade e alegria: "(...) CADA UM CONTRIBUA SEGUNDO TIVER PROPOSTO NO CORAÇÃO, NÃO COM TRISTEZA OU POR NECESSIDADE; PORQUE DEUS AMA A QUEM DÁ COM ALEGRIA (...)"- (2Co 9.6-90). E é este o entendimento do espírita para o dízimo, uma doação espontânea em dinheiro e/ou trabalho. Sem definição de quantidade (10%), as doações devem ser segundo o desejo de cada um. Os freqüentadores e trabalhadores de um Centro Espírita sabem das dificuldades para manter uma casa espírita. Por isso, os que entendem a importância do trabalho que o Espiritismo realiza, contribuem mensalmente com pequenas quantias que são de grande valor para as contas da casa. E ninguém é tão pobre que não tenha algo para doar. Se a doação for em dinheiro, este deve ser usado na manutenção da casa espírita (água, luz, produto de limpeza e higiene, etc.), no material que ajudará na divulgação e entendimento do Evangelho segundo a visão espírita (panfletos, jornais, rádio, TV, etc.), mas principalmente no auxilio aos irmãos mais carentes de qualquer religião (remédio, roupa, cestas básicas, etc.). Não concordamos em guardar o dinheiro “DO SENHOR” em poupança e aplicações diversas enquanto há tantos irmãos necessitados de auxilio. Também não achamos correto usá-lo para viver. Entendemos que o dinheiro é para a obra do “Senhor”, não para a obra dos “senhores” que falam do “Senhor”. Os trabalhadores espíritas são voluntários sem remuneração material, só espiritual. Temos como exemplo Chico Xavier. Este viveu do salário de seu trabalho como servidor público. Todo dinheiro da venda dos livros psicografados por ele era e ainda é destinado a obras de caridade.


Se a doação for através do trabalho, este significa dispensarmos algum tempo disponível em serviço voluntário destinado a Caridade. Mas a Doutrina ensina como devemos fazer doações. Ela pede que ao nos comprometermos em ajudar, seja com dinheiro ou trabalho, devemos cumprir o quanto possível com o compromisso livremente assumido. Que não devemos começar a fazer algo por empolgação ou assumir dois ou mais trabalhos e faltarmos por qualquer motivo. É preferível escolhermos apenas um e fazer bem feito. Afinal, o cristianismo exalta a responsabilidade, o cumprimento da palavra e do dever. Pois a instituição passa a contar com nossa ajuda e se falharmos, sobrecarregaremos alguém seja no trabalho ou na parte financeira. E se o compromisso for em creches, asilos, hospitais, ou seja, onde pessoas aguardam nossa ajuda ou visita, pensemos ainda mais antes de começarmos, para que nossa ausência ou desistência não frustre estes carentes emocionais. Não podemos esquecer que, no trabalho que buscamos o pão espiritual recebemos remuneração espiritual e quando faltamos ou abandonamos não somos punidos, mas adiamos o pagamento de nossas dívidas, porque aprendemos que: “O AMOR COBRE MULTIDÕES DE PECADOS” (I Pedro 4,8), ou seja, todo amor que estendermos ao próximo estaremos quitando multidões de erros, tropeços ou falhas que cometemos quando transgredimos a lei divina, seja nesta encarnação ou na anterior. Exemplo: há mulheres que são estéreis porque geralmente abortaram em outra encarnação, e revertem este carma quando adotam uma criança. Como vemos, quando ajudamos o próximo, somos os maiores beneficiados.


Portanto, CARIDADE é o dízimo que Deus espera de nós e é o que os espíritas ofertam (ou estão aprendendo a ofertar) a Ele através do próximo, seja ele espírita ou não.