quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

A serviço do BBB

Certa vez, vi um documentário sobre o retorno à casa dessas senhoras passistas de escolas de samba. Mostrava-as lá, na posse da avenida, rainhas da televisão, havendo-se por tão lindas quanto linda se pode ser. Depois, o amargo regresso: a fila para o ônibus, a dificuldade de fazer suas vestes atravessarem as catracas do cobrador, o desembarque atabalhoado, a subida do morro, o suador, o cansaço.
Que valor tem isso? Sim, há a glória do fugaz expor-se às arquibancadas. Mas que discernimento é esse que vê proveito que compense tanta humilhação? Essa servidão voluntária ao “maior espetáculo da terra”, será que é consciente, ou apenas acontece? Bem, eu não entendo as evoluções mentais das pessoas que se dão em sacrifício ao carnaval, mas sei que, no próximo ano, elas estarão lá.
Noutra vez, eu via um filme na Globo. De repente, no intervalo, começa algo que não era propaganda nem era o filme. Acreditei que havia “pulado” o canal. Nada, eu estava sendo apresentado ao Big Brother Brasil. Aquilo era puro voyeurismo. Pessoas de gosto muito peculiar estavam ali, expondo-se e, supus, sendo vistas por milhões de outras pessoas de gosto tão característico quanto.
Em suas várias edições, o BBB consiste nisso e não passa disso: comportamentos-limite expostos à plebe ignara. E a choldra está sempre ávida pela transgressão desses limites. Há excitação nas redes sociais quando alguém faz uma “malcriação”, há vídeos no You Tube mostrando “posições quentes” e, imagino, há inúmeros onanistas internéticos deleitando-se em ver o que não fazem.
Agora, um vídeo está solto no ar. Nele haveria cenas de um estupro. Eu o vi, mas não posso afirmar se houve ou não o crime. Se houve, é caso de polícia, e o mais que se diga não vale nada. As vozes indignadas denunciando machismo são válidas porque são válidas todas as vozes que denunciam machismo. Mas o BBB é, antes, negócio. Vil, torpe, boçal, mas negócio. E muito prestigiado pelo ético povo brasileiro.
Pelo que observei, no BBB, há os interesses da Rede Globo e o arrivismo de ladinos rasos. A Globo, certamente, está fazendo negócio, e, nesse negócio, a dimensão do escândalo é medida de faturamento. Mas os participantes estão ali por prêmio e chance de fama. Não poucos venderiam a “alma” pelo sucesso, de preferência chamando a atenção sobre si e dispondo-se a pagar altos custos, digamos, morais.
Quanto ao vídeo, são duas pessoas sob as cobertas, há movimentos que insinuam sexo, a mulher estaria bêbada, o homem teria se aproveitado da sua condição fragilizada, o que configura estupro. Pode ser, mas não dá para ver o que ocorreu, só inferir. De toda forma, seja lá o que tenha acontecido, a mulher negou estupro e recusou submeter-se a qualquer exame. Pronto, juridicamente, caso encerrado.
Não obstante, há um esforço (sério) de muita gente, buscando configurar um estupro. Mas, ora, a Globo monitora cada movimento dos seus enclausurados. O que acontecia era filmado por profissionais competentes, com poder de decidir o que deve ir ao ar. Não houve um descuido, um acaso. Então, o escândalo, as iras que surgiram, a polêmica, isso é o que se chama de risco calculado.
Houve o fato, mas a barafunda é fomentada. Episódio e reações são gerenciados. Claro, o Ministério Público vai pedir explicações, ficará um ar de dever cumprido por parte das autoridades. A própria Globo, aliás, já julgou o caso, defenestrando o “matador”; deu-o como expiação às piranhas morais. Mas, cá pra nós, nem a vítima deu muita bola para o assunto. Isso lembra um triste fim de carnaval. Nada mais.

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