Em nossos lares, pela tela da TV, a Rede
Globo nos faz relembrar (ou conhecer) Juscelino Kubitschek de Oliveira, o JK,
também apelidado carinhosamente por sua mãe como “Nonô”.
Personalidade forte e marcante, ímpar em nossa história, Juscelino é
apresentado como um dos maiores presidentes que nosso país
conheceu, principalmente se considerada a
característica democrática de sua ascensão ao poder, pelo voto popular
(direto). Em cinco anos de governo, muitas realizações, destacando-se, em
primeiro plano, a abertura para a industrialização em massa e a
transferência da capital federal, com a construção da maravilhosa Brasília.
São vários os biógrafos e as fontes
relevantes para a reconstituição da personalidade de JK – inclusive,
enaltecendo suas virtudes e descrevendo seus defeitos – bem como, política e
sociologicamente é imperioso conhecer os prós e os contras de sua
administração à frente do Governo Federal. Há quem diga que Juscelino foi o
“maior presidente”, um visionário, um “tocador de obras”, um “faz-tudo”.
Outros, com os olhos mais críticos (e ácidos) são capazes de identificar
problemas administrativos, como a corrupção governamental e a assunção de
obrigações (financiamentos) em níveis que comprometem nossa saúde
econômico-financeira até os dias hodiernos.
A princípio, devemos
estar, uma vez mais, preparados para, em clima eleitoral para o cargo
de mandatário-mor do país, sermos “bombardeados” por propagandas e discursos
que tenderão a “aproximar” este ou aquele candidato ao “perfil” ou ao
“estilo” jusceliniano. Já tivemos oportunidade,
em passado recente (eleições presidenciais de 1989), de verificar até que
ponto chegam nossos políticos, seja por tentar
vincular as idéias e o “espírito” de trabalho de JK e o seu, próprio, ou por
apresentar depoimentos de parentes, correligionários e, até, pitonisas e
videntes, dizendo-se que este ou aquele será um “missionário” para “salvar”
nosso país. Não nos surpreenderemos, pois, se o assunto voltar à baila.
De início, o lema “50 anos em 5” foi,
inegavelmente, a grande marca de Nonô, cujo
cinqüentenário de posse comemora-se em 31 de janeiro, numa época em que não
haviam as balizas e os limites da
“responsabilidade fiscal”, razão pela qual foi possível investir em seu
Programa de Metas bilhões de dólares, em cinco áreas (dedos da mão):
energia, transportes, alimentação, indústria de base e educação, o que lhe
permitiu entregar o poder para seu sucessor, Jânio Quadros, cumprindo
integralmente seu projeto de governo – depois dele, ninguém mais obteve tal
êxito.
JK construiu uma nação e é difícil
imaginar o Brasil sem tal impulso, mesmo que se cogite que outros poderiam
ter feito – em ritmo menor e, talvez, com menos dívidas – ações naquelas
áreas, consideradas “vitais” para o desenvolvimento estatal e social.
Desde cedo, revelou-se um menino inquieto
e sonhador, com um destacado espírito de luta para enfrentar as adversidades
(como se sabe, ficou órfão de pai aos três anos de idade e sua mãe, com
inúmeras dificuldades financeiras, assumiu o encargo de, como professora
primária, sustentar ele e a irmã, Naná). Sua
honestidade e retidão de caráter ficam marcantes quando, necessitando
continuar seus estudos, ao procurar um Seminário, sendo questionado pelo
Superior, se desejava ser padre, para ter gratuitos seus estudos, revelou
que queria ser médico.
No labor profissional, como médico, teve
diversificadas situações em que o amor pela medicina e a dedicação ao
juramento de Hipócrates, levaram-no a atender graciosamente inúmeros
enfermos, demonstrando suas qualidades de devotamento e desprendimento dos
bens materiais. E, ainda assim, alistou-se como capitão-médico da Força
Pública, atuando habilmente no salvamento dos enfermos das batalhas.
Como político, caracterizou-se como hábil
administrador – daqueles que conduz, pessoalmente, cada trabalho,
experimentando cargos no legislativo e no executivo, seqüencialmente
(Deputado Federal, Senador, Prefeito, Governador, Presidente e, nova e
finalmente, antes da cassação pela ditadura, Senador). Neste parâmetro,
inaugurou um novo “estilo” de gestão, abandonando o gabinete e despachando
diretamente com a população, seja pela franquia do ingresso do povo nos
palácios, seja pela presença nos “comitês de
bairro”, os atuais centros comunitários e associações de bairro.
Carismático, logo tornou-se um cidadão “do
Brasil”, muito além do “político de Minas”.
Visionário, pensou muito além de seu
tempo, porque estrategicamente planejou o cenário das futuras gerações,
quando afirmou, no discurso de inauguração da Capital Federal: “Deste
Planalto Central [...] lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu
país e antevejo esta alvorada com fé inquebrantável e uma
confiança sem limites no seu grande destino” (grifos nossos).
Parece-nos haver relativa semelhança com o ideal
espírita estampado em “Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho”,
quanto à “terra de promissão”, o “celeiro do mundo”, desde que, sem qualquer
interpretação pedante e proselitista, ainda que
ufanista, não se creia (como no passado) em uma “superioridade” étnica e
político-social do Brasil sobre qualquer nação, nem, tampouco, na
reconstrução do ideário de “terra prometida”, excludente e reducionista.
Todos nós, espíritas, que aqui nos encontramos encarnados, nesta terra
abençoada, livre de grandes catástrofes, ameaças e convulsões sociais ou
guerras, entende a necessidade do engajamento
cívico para a transformação do país e do orbe. Neste sentido, JK anteviu o
(nosso) trabalho necessário do hoje, e os frutos para o amanhã.
Amou,
verdadeira e integralmente sua cidade, seu Estado, seu país, a ponto de
reinventar Belo Horizonte e conceber Brasília, calcado em projetos de
reurbanização e programas sociais. Isto, longe de desgostar de suas amadas
“do jeito que eram”, mas, do contrário, amando-as de tal maneira que tudo
fez para torná-las ainda mais belas e notáveis, tal qual o namorado que
presenteia sua musa com perfumes, cremes e
maquiagem.
Sonhador e realizador,
conciliou teoria e prática, do mesmo modo como, para a concretização
do homem de bem (cristão e espírita) é imperioso exceder a simples projetos,
dando-lhes vida e materialidade.
Como atributos de tal “estatura” moral,
podemos identificar em JK a simpatia e o poder de persuasão, materializado
num sorriso simpático e cativante, derivado da confiança que os outros
depositavam nele. Em conseqüência, qualquer homem ou mulher que tenha vivido
aqueles dias, pode testemunhar o favorável clima de otimismo que nutriam as
pessoas, tornando o brasileiro mais convicto de suas qualidades e
habilidades e a possibilidade (real) de vencer as adversidades. O eleitorado
sempre dele ficou cativo.
A popularidade de
Nonô continuou aumentando, mesmo com sua retirada estratégica do
cenário político brasileiro, graças à lembrança nostálgica (até hoje) de um
tempo de prosperidade, otimismo e liberdades, além da intensa produção e
riqueza cultural (principalmente na música).
Humilde, em nenhum momento reagiu à perda
dos seus direitos políticos e ao forçado exílio, grandeza de espírito ao
suportar a distância da pátria, da família e de tudo o que lhe dava
satisfação e prazer. Na terra distante, dedicou-se a escrever e suas
memórias em nenhum momento transpareceram sentimentos negativos de rancor,
inveja ou ódio.
Derradeiramente, a tragédia de sua morte,
também, contribuiu para a formação e a perpetuação do “mito” JK.
Mas, este ensaio não visa “esquartejar” o
homem JK, nem, tampouco, discorrer exaustivamente sobre qualidades ou
desvios de conduta de um espírito encarnado em situação semelhante à nossa.
Do contrário, tencionamos, aproveitando o “clima” decorrente do resgate de
sua trajetória política, enquadrar seus feitos e suas idéias dentro da
interpretação filosófico-científica espírita, à luz dos fundamentos e
princípios espiritistas.
No que consiste a adjetivação espírito “missionário”?
Em que bases está assentada tal categoria?
O adjetivo missionário vem do substantivo
missão, o qual, por sua vez, deriva do latim “missione”,
significando encargo ou incumbência de fazer alguma coisa. De maneira geral,
no mais amplo espectro de consideração, todos os
espíritos, possuem missões pré-estabelecidas, em diversificados
locais, setores e atividades, as quais compõem o chamado planejamento
encarnatório. Quanto mais adiantado, o espírito
pode projetar e visualizar a existência inteira, do nascimento ao
desencarne, sem, contudo, isto significar que as mínimas situações da vida
estarão “previstas” ou projetadas, tendo em vista o mais amplo dos direitos
espirituais, a liberdade de agir, que altera substancialmente compromissos,
responsabilidades e vivências. Então, se todos – invariavelmente – temos
missões, é necessário graduá-las de acordo com a significância (pessoal e
social), a atuação nos meios em que se encontra inserido, e o crivo de
utilidade para os mais distintos grupos sociais (dos menores aos mais
amplos). Diz-se, portanto, que este ou aquele indivíduo pode ter importância
destacada em seu bairro, cidade, país, ou, até, no planeta inteiro, o que
pode ser um dos critérios para avaliar a grandeza (ou não) de sua atividade
missionária.
Evidentemente, conforme a tipologia
empregada na classificação das missões, poderemos
chegar à identificação daqueles “de escol”, os chamados “avatares”,
capazes de concretizar, por suas ações, as grandes realizações e
transformações em nosso orbe, destacando-se por seus ensinamentos e sua
prática de elevada conduta moral é ética.
No viés espiritual, com base nas
informações básicas espíritas (contidas, sobretudo, em O livro dos
espíritos), como poderia ser analisada a tarefa de JK? Teria ela,
características de uma existência missionária? Ou enquadrar-se-ia, apenas,
em uma tarefa provacional, decorrente apenas do
cargo ocupado, como sói acontecer com a maioria das pessoas em suas
profissões e ocupações habituais?
O ponto de partida para o entendimento de
missão é a questão 573. Ela consiste “Em instruir os homens, em
lhes auxiliar o progresso; em lhes melhorar as instituições, por meios
diretos e materiais. As missões, porém, são mais ou menos gerais e
importantes. O que cultiva a terra desempenha tão nobre missão, como o que
governa, ou o que instrui. Tudo em a Natureza se encadeia.
Ao mesmo tempo que o Espírito se depura pela
encarnação, concorre, dessa forma, para a execução dos desígnios da
Providência. Cada um tem neste mundo a sua missão, porque todos podem ter
alguma utilidade.”
Os exemplos trazidos pela Falange da
Verdade, enquadrando atividades de agricultor, governante e professor, podem
ser elevados à potência infinita para esquadrinhar as mais diferentes
profissões e tarefas laborais desempenhadas pelos humanos. Delas resulta,
essencial e logicamente, o proveito pessoal para aqueles que a (bem)
desempenham, podendo, alguns frutos ou resultados serem benéficos para
outrem, na gradação do tipo de proveito que possam ter usufruído. Também o
livro básico considera a paternidade (pai e mãe) como mister missionário,
sobretudo porque relacionado à educação, instrução e condução dos filhos
pelo mundo. Tais misteres, todavia, mais parecem ocupações comuns do que
missões.
Paralelamente, se nos detivermos no
conceito técnico, stricto
sensu, de missão, simbolizando as
existências valorosas de determinados indivíduos e sua atuação em favor do
próximo, em atividades de esclarecimento, orientação, assistência social,
educação, saúde, entre outras, poderemos reduzir o leque de apreciação.
Nisto reside, particularmente, a colocação do Espírito Verdade, "[...]
instruir [...], auxiliar o progresso" dos homens.
Juscelino, ao assumir sua vocação
administrativa, gerencial, político-social, projetando e concretizando seus
sonhos de políticas públicas, e, além disso, travando contatos comunicativos
com o povo – por seu carisma e simplicidade –, proporcionou considerável
avanço para o país e para a coletividade brasileira, levando-nos a
considerá-lo, na esteira do conhecimento espiritista, como "[...] farol
ao gênero humano, que o iluminam com a luz do gênio" (item 581, de OLE)
e, por revelar aos homens a lei de Deus (especialmente nos quesitos
Trabalho, Progresso, Sociedade e Justiça, Amor e Caridade), pode ser
considerado como um Espírito Adiantado, ou, até, Superior (conforme descrito
na questão 622), à luz do contido na escala espírita (quesito 100),
reconhecido por suas palavras e atos (item 624), reunindo, de certo modo, a
ciência, a sabedoria e a bondade e sua linguagem é benevolente, encarnando
na Terra para nos oferecer, por seu trabalho, sua dedicação, seu empenho em
favor do coletivo, o tipo da perfeição a que a Humanidade pode aspirar neste
mundo.
Não é esta, senão, a diretriz contida, também, em uma das mensagens inclusa
na Revista Espírita de 1861 (“Os Missionários”): “[...]
Espíritos mais elevados têm por missão vos
fazer progredir, vós mesmos.”
Mesmo havendo críticas a algumas de suas
posturas e censuras (passadas e presentes) direcionadas a atos por ele
praticados, JK não faliu na missão que abraçou, mesmo com a influência
(poderosa) da matéria, as facilidades do mundo.
Figurando na galeria dos homens públicos
do Brasil, ocupa destacado papel, em importância, em resultados, em
progresso, honrando, portanto, os misteres que lhe foram confiados, seja
pela Espiritualidade Superior, seja pelos
cidadãos que a ele conferiram o democrático sufrágio.
Para finalizar, recorrendo a seus
biógrafos, encontramos, dentre as inúmeras frases pontuais que ilustram sua
trajetória, aquela que mais identifica o Espírito Juscelino Kubitschek:
“Deus poupou-me o sentimento do medo”. Precisa mais? Aliás, como
espíritos imortais, devemos temer algo?
Em tempo: Juscelino nasceu a 12.09.1902,
em Diamantina (MG) e desencarnou em um acidente automobilístico, na Via
Dutra, próximo a Resende (RJ), em 22.08.1976.
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