Petronio Alves da Cruz
Servidor Público Federal do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região em Campinas (SP), Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Especialista em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas e Especialista em Segurança Pública e Sociedade pela mesma Universidade mediante convênio com o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP).
Servidor Público Federal do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região em Campinas (SP), Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Especialista em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas e Especialista em Segurança Pública e Sociedade pela mesma Universidade mediante convênio com o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP).
O presente estudo faz uma análise da obra O Caso dos Denunciantes
Invejosos, escrita por Dimitri Dimoulis e traduzida por Lon L. Fuller. A
obra narra acontecimentos de uma nação que tem aproximadamente 20
milhões de habitantes e que vive por longos anos sob um regime pacífico,
constitucional e democrático. Com o surgimento de uma forte crise
econômica, grupos passam a divergir com relação à economia, política e
religião.
Surge, assim, alguém de forte liderança, o chefe do partido
autodenominado Camisas Púrpuras. Após eleições, este chefe atinge a
maioria de votos que lhe dão o direito de assumir a Presidência da
República. Também o seu partido obteve a maioria de vagas na Assembleia
Nacional.
O partido dos Camisas Púrpuras, quando investido no poder, não muda a
legislação posta, nem a Constituição, nem o Código Civil, nem o Código
Penal, nem os Códigos Processuais. Também não são tomadas providências
com relação à mudança dos funcionários públicos e juízes, tudo isto
permanece como está, porém, vivencia-se um clima de terror.
Os acusados que praticassem atos favoráveis ao governo ganhavam anistia
geral e passavam a ser membros do partido dos Camisas Púrpuras.
No partido, existiam duas facções: uma que queria que os bens do partido
fossem confiscados, porque estes bens teriam sido adquiridos por meios
criminosos; a outra facção queria que os proprietários doassem estes
bens para o partido sob ameaças. O chefe do partido então emitiu um
regulamento secreto por meio do qual os bens obtidos por meio de
violência física tiveram ratificada a sua ilegalidade.
Com o tempo, o governo comandado pelo partido dos Camisas Púrpuras chega
ao seu fim e um novo governo com regime democrático começa a governar.
Muitos problemas a resolver foram deixados pelo governo anterior, e um
deles é exatamente a questão dos “denunciantes invejosos”.
Vejamos quem fazia parte do grupo dos “denunciantes invejosos”. Eram
pessoas que, movidas pela inveja, denunciavam seus inimigos pessoais ao
governo do partido dos Camisas Púrpuras, alegando que estes criticavam o
governo, escutavam estações do governo estrangeiro, que tinham amizade
com vândalos e baderneiros, que armazenavam saquinhos de ovo em pó em
quantidade maior do que a permitida, ou a omissão de informar a perda de
documentos no prazo de cinco dias.
Após a derrota dos Camisas Púrpuras, a população reivindicou a punição
dos “denunciantes invejosos”. A opinião pública pressionou de tal
maneira que urgia uma solução.
A obra requer a interatividade do leitor, pois nos apresenta a opinião
de cinco deputados e cinco juristas para que possamos formar uma
cognição e tomarmos o nosso próprio posicionamento.
ANÁLISE DA OPINIÃO do PRIMEIRO DEPUTADO
Analisando a decisão do primeiro deputado, chegamos à conclusão de que
contém os elementos a seguir expostos: ele afirma que a) nada pode ser
feito com relação aos denunciantes invejosos, já que estes denunciaram
fatos ilícitos praticados contra o Estado; b) as sentenças das vítimas
dos denunciantes invejosos estavam em consonância com os princípios
legais então vigentes; c) o juiz, na época dos acontecimentos, possuía
uma liberdade mais ampla para julgar; d) os testamentos precisavam
somente de duas testemunhas.
O primeiro deputado também afirma:
“(...) a diferença entre nós e os Camisas Púrpuras não está no fato de
que eles formaram um governo sem leis. Isso seria, aliás, uma
contradição nos termos, pois todos os governos seguem determinadas leis.
A diferença é de natureza ideológica. Ninguém acha os Camisas Púrpuras
mais repugnantes do que eu. Devemos, porém, reconhecer que a fundamental
diferença entre a filosofia deles e a nossa está no fato de que nós
permitimos e toleramos a expressão de pontos de vista divergentes, e
eles tentaram impor a todos o próprio código monolítico.”1
Finalizando a opinião do primeiro deputado, este afirma que o programa
proposto por ele sofrerá duras críticas da opinião púbica, porém, é o
único programa que permitirá com que triunfem as concepções atuais sobre
Direito e governo, alertando também para que seja evitado que a
população faça justiça com as próprias mãos.
SEGUNDO DEPUTADO
O segundo deputado diz que a sua opinião é similar à do primeiro, porém,
para fundamentá-la, adota um caminho totalmente oposto. Assim, opõe-se
ao entendimento de que, na época em que governaram os Camisas Púrpuras,
houvesse a égide da legalidade. Afirma que o fato de os Camisas Púrpuras
não terem revogado as leis não quer dizer que eles as aplicassem, já
que tudo indica que tanto a Constituição e as leis permaneceram
guardadas nos armários.
Este deputado também faz a seguinte reflexão: as leis existentes em
determinada nação devem ser conhecidas pelos seus destinatários, e a lei
aplicada a casos semelhantes deve ser a mesma.
Outra afirmação importante é com relação aos três poderes. Estes, na
época do governo, não existiam. O governo se sobrepunha inclusive à
atuação do Poder Judiciário, interferindo na administração da justiça de
acordo com os seus interesses particulares.
O que, na verdade, existiu durante o governo dos Camisas Púrpuras foi
uma guerra de todos contra todos, com intrigas inclusive entre os
próprios governantes e em conspirações nos pátios das prisões.
Para finalizar, o segundo deputado afirma que as coisas devem continuar
como estão e nada deve ser feito com relação aos denunciantes invejosos,
porque estes não viveram em um Estado de Direito, e sim em um regime de
anarquia e terror.
TERCEIRO DEPUTADO
Para o terceiro deputado, as opiniões dos deputados anteriores não são
nem moral nem politicamente aceitáveis, já que todos os atos praticados
pelos Camisas Púrpuras não podem ser classificados como fora da lei,
como também não se pode afirmar o contrário.
Este deputado não aceita a afirmação do segundo deputado de que existia
uma guerra de “todos contra todos”, já que, além das irregularidades,
paralelamente existia uma vida normal, onde foram realizados casamentos,
compra e venda de bens, eram redigidos e executados testamentos e tudo
mais que normalmente acontece em uma nação.
O terceiro deputado ainda fez a seguinte reflexão: se os atos criminosos
cometidos pelos membros do partido dos Camisas Púrpuras fossem
condenados, seria um contrassenso avalizar todos os atos praticados
pelas autoridades do governo, já que o governo se identificou
completamente com o partido dos Camisas Púrpuras.
O terceiro deputado também cita os casos em que os denunciantes
invejosos atuavam não com a finalidade de se livrar dos seus inimigos
pessoais, e sim por fidelidade e subserviência ao governo.
Para ele, o fato de haver casos em que não está clara a culpabilidade
dos denunciantes invejosos não é motivo para que fatos onde há atuação
ilícita dos denunciantes invejosos não sejam julgados.
QUARTO DEPUTADO
Há um ponto convergente entre a opinião do deputado anterior e do atual
deputado: eles não gostam de raciocínios que se baseiam em dilemas,
porém, para este, a reflexão deve ser mais profunda.
Assim, para ele, escolher determinados casos ocorridos no período de governo dos Camisas Púrpuras encontraria algumas objeções:
“(...) na realidade, constitui um puro e simples camiso-purpurismo.
Gostamos desse direito, então podemos implementá-lo. Gostamos desse
julgamento, então podemos admití-lo. Aquele direito, porém, que não é de
nosso agrado deve ser considerado como inexistente. Aquele ato
governamental que reprovamos deve ser tachado de nulidade.”2
Adotando este posicionamento frente ao problema dos denunciantes
invejosos, estaríamos adotando o mesmo posicionamento do governo dos
Camisas Púrpuras. Para ele, o resultado de tudo isto seria impróprio, já
que cada juiz e cada promotor adotaria um posicionamento mais
conveniente.
Do ponto de vista deste deputado, só haveria um caminho a ser percorrido
para não sucumbir a novos equívocos, qual seja, a elaboração de uma
nova lei:
“(...) devemos estudar de forma abrangente e detalhada os vários
aspectos do problema dos denunciantes invejosos, coletarem todos os
dados importantes e elaborar uma lei para regulamentar todos os
desdobramentos do problema.”3
QUINTO DEPUTADO
O quinto deputado faz duras críticas à opinião do quarto deputado, já
que afirma que a solução sugerida por ele seria tomar uma atitude igual a
que foi adotada pelos Camisas Púrpuras, ou seja, que seja editada uma
lei retroativa.
A sua preocupação está no fato de que criar uma nova legislação para
julgar os casos praticados pelos denunciantes invejosos seria
extremamente difícil, por isso ele decide fazer uma nova proposta.
Assim, o quinto deputado cita que existe uma autor renomado de Direito
Penal, que afirma que a finalidade principal deste ramo do Direito é
satisfazer o instinto humano de vingança, portanto, há períodos
históricos em que isto deve ser aceito como uma verdade.
Após a conferência com a opinião dos cinco deputados, surgem diversas
dúvidas. Dentre elas, está a questão de que as propostas feitas pelos
deputados podem causar problemas de ordem jurídica, trazendo mais
prejuízos à nação. O livro sugere que, antes de emitir uma opinião,
sejam lidas cinco propostas de juristas renomados.
OPINIÃO DO PROFESSOR GOLDENAGE
Para o Professor Goldenage, é muito importante o aspecto jurídico do
problema em questão, apesar de terem sido convocados a princípio somente
deputados para emitirem opiniões políticas.
O panorama colocado pelos deputados fez com que o professor construísse três argumentos jurídicos, quais sejam:
“a) Todas as leis em vigor durante o regime dos Camisas Púrpuras devem
ser consideradas válidas, pois a norma que entra em vigor de forma
correta não pode ser anulada retroativamente. Para quem aceita essa
posição, os Denunciantes atuaram de forma legal, seguindo o direito
vigente. Esse argumento permite propor três diferentes soluções: o
primeiro deputado constata o caráter legal das denunciações invejosas,
propondo a impunidade: o quarto deputado considera que estes atos não
eram puníveis quando foram cometidos, mas devem ser castigados, hoje,
após a criação de uma lei retroativa: o quinto deputado propõe tolerar
os linchamentos e a vingança popular, já que os atos dos denunciantes
não podem ser definidos de forma satistafória por meio de uma lei
retroativa.
b) Durante o regime dos Camisas Púrpuras, não houve direito válido, já
que o regime era profundamente injusto, renegando a ideia mesma de
justiça. A situação era parecida com aquela de uma selva. Punir um
denunciante invejoso não é menos absurdo do que punir um animal selvagem
porque devorou um outro (segundo deputado).
c) Devem ser consideradas inválidas somente aquelas normas do regime dos
Camisas Púrpuras que não se conciliam com os ideais da justiça. Os
denunciantes aproveitaram-se de uma perversão da justiça durante esse
regime e por isso devem ser castigados (terceiro deputado).”4
A ideia de Gordenage é bastante clara, tanto os denunciantes invejosos,
como as autoridades estatais que agiram frente às denúncias feitas,
cometeram o crime de subversão da ordem política e social. Devem,
portanto, ser punidos, já que a nação atualmente restabeleceu um sistema
jurídico fundamentado na justiça.
PROFESSOR WENDELIN
O Professor Wendelin analisa primeiramente a opinião emitida pelo
Professor Goldenage. Para ele, o posicionamento o faz lembrar-se das
faculdades medievais, onde os problemas jurídicos eram debatidos com
paixão, por meio da retórica e uma habilidade ímpar no uso dos
argumentos.
No século XX, os alicerces destas teorias foram abaladas: “(...) os
significados das palavras são instáveis e múltiplos e dependem do
entendimento das pessoas que se comunicam em determinado momento.”5
Para o Professor Wendelin, cabe ao juiz julgar, não cabe nem ao
legislador nem ao doutrinador: “nenhuma lei e nenhuma reflexão teórica
serão mais poderosas do que a decisão do magistrado mais humilde.”6
O juiz, baseado em elementos sociais, políticos e psicológicos, tomará a
sua decisão, e o processo será o caminho percorrido na busca da
verdade.
Para Wendelin, o Direito é um instrumento para melhorar a vida social, e
é por isso que o juiz deve pensar na utilidade social de suas decisões.
PROFESSORA STING
Para a Professora Sting, até o momento, todas as opiniões tanto dos
deputados como dos juristas foram sob uma ótica masculina, portanto, ela
aponta o exemplo em que um denunciante invejoso faz com que o cônjuge
de uma mulher que ele tinha se apaixonado seja morto pelo governo dos
Camisas Púrpuras para que a mulher ficasse com ele. O que houve, na
verdade, na época do governo dos Camisas Púrpuras, é o castigo com pena
capital para infrações de pouca ofensividade.
Vemos, assim, que a professora se fundamenta em uma análise feminista e
invoca a aplicação do Direito Internacional. Sabemos hoje que tem uma
repercussão negativa aquele país que quer adotar a ditadura como forma
de governo.
PROFESSOR SATENE
O Professor Satene começa emitindo sua opinião dizendo que a Professora
Sting faz sua fundamentação a partir da análise feminista do Direito,
esquecendo que fatos de grande repercussão aconteceram. Ele cita que a
Alemanha vivenciou a barbárie nazista e que, após a restauração da
democracia naquele país, um tribunal enfrentou o caso da esposa
denunciante. Uma mulher que tinha um relacionamento extraconjugal
decidiu denunciar o marido por ter criticado o governo de Hitler. O
marido foi condenado à morte e, após um indulto, foi mandado para a
guerra, sendo incorporado em uma unidade militar na qual serviram
criminosos em condições terríveis.
Antes de concluir, o professor faz um paralelo com o que aconteceu com os denunciantes da Alemanha, afirmando que:
“(...) os tribunais alemães tiveram a ocasião de condenar os autores de
denunciações que se aproveitaram do delírio de uma ditadura para
satisfazer instintos de ódio e vingança. O princípio moral que justifica
estas condenações é claro. Ninguém pode se prevalecer de uma norma em
vigor para realizar um projeto criminoso, que nem o mais cruel ditador
teria aprovado.”7
E ele sugere que os denunciantes invejosos sejam julgados em
conformidade com os ditames do Código Penal, tendo em conta que a
autoria foi mediata ou indireta, já que eles utilizaram outras pessoas
para o cometimento de seus crimes, ou seja, policiais, promotores e
juízes.
PROFESSORA BERNADOTTI
A Professora Bernadotti quer que os denunciantes invejosos sejam julgados por meio de uma constituinte, já que ela afirma:
“(...) este ato constituinte não estará sujeito ao controle dos
tribunais, como teme o senhor Ministro, já que não se trata de uma
simples lei do Poder Legislativo, mas decorre do poder constituinte
originário, que é superior a qualquer autoridade do Estado. (...) Qual
deve ser o conteúdo deste ato constituinte? Em primeiro lugar, devem ser
previstas sanções para todos os colaboradores do antigo regime. Os
policiais, juízes e demais funcionários que colaboraram com o regime
permitido que suas nefastas ordens fossem executadas estarão sujeitos à
penalidades. Punir somente os denunciantes invejosos é uma hipocrisia,
já que a responsabilidade deles é muito menor do que a dos funcionários
públicos que se tornaram obedientes instrumentos da ditadura.”8
CONCLUSÃO
A leitura desta obra fictícia permite interatividade e nos faz refletir
sobre a diferença entre opiniões políticas e opiniões jurídicas.
Lembra-nos de nossa responsabilidade na hora de votar, já que estamos
elegendo aqueles que serão responsáveis pela elaboração das leis em
nosso país.
Ao longo da leitura, podemos analisar diversas linhas de interpretação
da lei e reiterar a importância da aplicação dos princípios de direito. O
conflito de leis no tempo. A importância de sermos governados por um
governo democrático.
O delito examinado é o cometido na época de ditadura de uma nação onde
denunciantes invejosos, muitas vezes, movidos por motivos pessoais,
faziam com que pessoas não gratas a eles fossem condenadas com a pena de
morte. E a população atualmente regida por um governo democrático clama
por justiça.
Somos da opinião de que estes denunciantes invejosos devem ser
processados e julgados conforme a legislação penal vigente, sendo
observadas as regras de hermenêutica jurídica e tendo em conta os
princípios basilares do direito. Sem sombra de dúvidas, que seja
aplicado o princípio mais abrangente de todos os princípios: o princípio
do devido processo legal.
NOTAS
1 DIMOULIS, Dimitri. O Caso dos Denunciantes Invejosos. São Paulo: RT, 2008, p. 40.
2 Idem, p. 46.
3 Idem, pp. 46-47.
4 Idem, p. 58.
5 Idem, p. 63.
6 Idem, p. 65.
7 Idem, p. 78.
8 Idem, p. 85.
BIBLIOGRAFIA
WAINSTEIN, Bernardo. Tortura Aspectos Penais e Processuais, in Prática Jurídica nº 64. Brasília: Editora Consulex, 2007.
Os Camisa-púrpuras congelam a constituição, o código civil, o código penal, códigos processuais e também a legislação chegaram ao poder por meios coercitivos como propostas insensatas, e patrulha noturnanoturna, intimidando a todos. Todos os crimes cometidos contra o direito natural do ser humano, como pode-se dizer que críticas contra o governo seria um crime que levaria até a sanção da pena de morte, confrontar todos direitos a dignidade humana esse era o governo do camisa-púrpuras. No caso dos Denunciantes invejosos se pode dizer que não só denunciavam por inveja e sim por apoiarem atitudes governamentais dos irrepugnates camisa-púrpuras, assim que se encerrou essa ditadura de terror todosos envolvidos nesses crimes contraa dignidade humana devem ser julgados de acordo com seus atos desde o chefe do partido até os denunciantes invejosos.
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